P Á G I N A S

terça-feira, 16 de julho de 2013

Que Saúde?!

  
Ainda não encontrei um pronunciamento não-chapa-branca que seja, se não favorável, ao menos complacente com a mais recente pirotecnia pós-protestos do governo federal: o programa Mais Médicos. Entidades profissionais e acadêmicas ligadas à área da Saúde estão detonando essa nova - e desastrada - jogada de marketing do Petê, que não tem qualquer pretensão de resolver o problema do atendimento médico à população brasileira. Os desdobramentos dessa invencionice já sugeriram até a demissão dos ministros da Educação (Mercadante) e da Saúde (Padilha), por se mostrarem absolutamente incompetentes em lidar com as atribuições de suas pastas. Não sem motivo. Nem sem vontade.

A incompetência se demonstra até nas tentativas de se explicar, querendo convencer a todos das vantagens do serviço civil obrigatório, do esgarçamento do curso universitário de Medicina por mais dois anos e da vinda de ativistas, perdão, médicos, da Cuba que os Pariu para cuidar do atendimento aos moradores nos rincões mais distantes do interior. Vejam só: para mostrar a pretensa qualidade das medidas (o serviço civil obrigatório e a faculdade em prazo dilatado), disseram que tratava-se 'de uma experiência bem sucedida na Europa' e que 'nada tinha sido gestado nos gabinetes de Brasília'. Ou seja: quem falou isso foi traído pelo inconsciente, pois admitiu, por via indireta, que o que provém desses gabinetes realmente não presta.

Verdade que tem sido assim, ao longo dos anos. Invariavelmente o sol do Planalto Central tem feito muito mal a quem se atreva a pensar sob a influência de seus raios. Mas não era para ser desse jeito; definitivamente, não. Paga-se caro pela manutenção de toda a estrutura montada naqueles confins e espera-se que de lá brotem boas ideias e soluções a contento para os desafios do Brasil. Não escândalos, aborrecimentos e desilusão, como o que tem sido oferecido ao povo brasileiro desde... Desde 1960. Desde sempre, portanto.

Sem dúvida, o Brasil mostrou grande capacidade de empreendimento com a aventura da nova capital, 53 anos atrás. Embora esse preço, jamais contabilizado, tenha sido alto: rapa dos cofres da Previdência, inflação alta, isolamento político (conveniente) das grandes decisões do país e por aí vai. Mas ainda resta esperança de que a Brasília, a cidade que não deveria ter existido, dê certo.

Por ora, essa esperança está toda depositada na saída - democrática, se possível - do Partido dos Trabalhadores (sic) do poder. Coisa que, aliás, uma vez bem resolvida, deve resolver não somente os problemas da capital federal, mas também os do Brasil como um todo!

sábado, 27 de abril de 2013

Pior é a emenda

  
A Proposta de Emenda à Constituição 33, de 2011, que cria uma imiscuição daninha do Poder Legislativo sobre o Judiciário, além de absolutamente descabida sob o próprio ponto de vista constitucional, possui nítido cariz retaliatório. Dos confins do Nordeste, eis que surge um protótipo de cangaceiro em defesa dos réus do maior escândalo de corrupção da história do Brasil, empunhando, a título de peixeira, mudanças milimetricamente calculadas na legislação.

Então não é isso? A iniciativa da PEC foi do deputado Nazareno Fonteles (PT-PI), surgida na época em que a tramitação do processo do mensalão estava em efervescência. No final de maio 2011, a Ação Penal 470 - designação jurídica da demanda - entrava no final da fase de alegações finais, tempo em que o Ministério Público Federal e os réus se manifestam pela última vez, para posterior conclusão e envio ao relator, para elaboração de voto.

Nazareno é cearense, médico, matemático e filiado à CUT. Foi vereador por Teresina e deputado estadual pelo Piauí, sendo galgado à Câmara Federal na esteira de Átila Lira (PSB), que deixou o mandato em Brasília, logo no terceiro dia, para ser Secretário da Educação e Cultura do PI e abrir vaga para seu obscuro suplente.

Percebe-se que o currículo parlamentar do cabra é sintomático. Além da PEC 33/2011, que submete decisões acabadas do STF à aprovação do legislativo e, em condição extrema, ainda a uma posterior consulta popular, constam também a INC 2918/2012 (indicação), que pretende a exoneração do Procurador-Geral da República - no caso, especificamente, Roberto Gurgel - antes do término de seu mandato; e ainda outra PEC, a 143/2012, alterando a forma de escolha de ministros do Supremo e criando para eles mandato com tempo estipulado: sete anos, em vez de vitalício. Além dos alvos óbvios na suprema corte, Roberto Gurgel, igualmente dedicado no caso do mensalão, é visado mais por sua atuação nas operações Vegas e Monte Carlo, da Polícia Federal, que desvendaram esquemas de corrupção associados ao empresário Carlos Augusto de Almeida Ramos, alcunhado Carlinhos Cachoeira, indiciado por envolvimento com o crime organizado e corrupção.

A PEC 33 foi aprovada pela Comissão de Constituição e Justiça da Câmara, da qual fazem parte José Genuíno e João Paulo Cunha, réus na Ação Penal 470 e diretamente beneficiados por um virtual desvio que conduzisse a decisão sobre seus futuros do tribunal para a esfera política.

STF e Poder Legislativo estão às turras: o ministro Gilmar Mendes e o presidente do Senado, Renan Calheiros, refugam a intromissão mútua dos poderes constitucionais num tom áspero poucas vezes visto no país. O Supremo detesta a ideia - também mal vista por setores da oposição e pela população em geral - de se ver contradito em decisões de última instância pelo capricho dos parlamentares. Estes, por sua vez, estão fazendo birra por conta da liminar concedida pela suprema corte, impedindo o trâmite da proposta (encabeçada pela bancada governista) que cria limitações ao desempenho de novos partidos que venham a ser criados. Independentemente do aspecto do excesso de agremiações políticas no Brasil, na verdade a situação não tem interesse no surgimento de novas siglas, ao menos neste momento, porque a tendência é de que elas venham predominantemente como oposição.

A imagem do parlamento brasileiro há muito que não é das melhores. Tanto pela leviandade de um contingente considerável de deputados e senadores, quanto pela subserviência que o legislativo tem demonstrado diante do rolo compressor do Planalto. O Poder Judiciário, por sua vez, resgatou credibilidade, com o desfecho do mensalão ao menos sinalizando um desejo de moralizade, tão necessária ao país.

É inadmissível que o deputado Nazareno Fonteles, por sua conta ou seguindo ordens superiores, se preste ao papel de instrumento antidemocrático de ataque à legalidade e à harmonia dos poderes da República. Felizmente, contamos com um expressivo número de parlamentares que não concordam com a PEC 33. Melhor ainda seria se a população tivesse um mínimo de interesse por política se desse conta do perigo que essa proposta enseja, em relação aos direitos e liberdades conquistados nos anos recentes, vindo a reagir a tudo isso.

Nossa democracia é um dos bens mais preciosos que possuímos, sem o qual somos politicamente frágeis. É algo pelo qual se lutar diuturnamente, em benefício de nossas próprias vidas.

Em tempo: curiosamente é o ministro Toffoli, acusado de ser simpático ao Petê no julgamento do mensalão, que está dando, a contar de ontem (sexta 26), um prazo de 72 horas para que a Câmara explique o espírito da PEC 33. Quem sabe pode ser um bom presságio...